segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Quase fim


Admirava a aurora que ia se construindo naquele precipício que era sua vida, figurativamente, e que estava, literalmente. Observava o horizonte como quem se despede sem querer partir, por motivo qualquer que seja. Apesar de não ser um qualquer. Pensava em desistir de tudo, depois se perguntava que tudo, se não tinha nada. Depois percebeu que se tinha um nada, já era alguma coisa. O vento das folhas fazia uma música de notas únicas, jamais capazes de serem compostas com tamanha maestria e perfeito encaixe para o momento.Quer sair dali, após perceber tamanha baboseira. No entanto, desatento, tropeçou no nada e no nada foi se lançando, desfalecendo no ar. Desligou-se de tudo, como se os olhos fossem virando, vagarosamente, para dentro de si. E começou a enxergar as coisas para quais fechava-os.Lembrou das vezes que por constrangimento recusou um carinho qualquer. Foi a última vez que teve essa chance. Lembrou também: da vez que não perdoou; que não amou; que não chorou; que não viveu... Que simplesmente vegetou, já por desacreditar em si.E foi, vivendo e aproveitando, aquele instante que mais pareceu horas, aquela passagem, cheia de loucura. Gostaria fazer diferente. Desejava que pelo menos o último sabor que degustaria da vida, fosse um doce, e não a amargura que era o arrependimento. O vento, agora, cantava muito mais forte, mais firme; enaltecedor da angústia, do desespero – ria, mas ria muito.Lembrou também da vez que um amigo quis dar um abraço, mas tão apressado apenas datilografou no ar com a mão esquerda. Agora tudo o que mais queria era um desses envoltos de braços e mãos.Continuou a agonizar no ar com uma efusão de sentimentos jamais sentida antes. Quis outra chance, mas quis tão forte que conseguiu. Porque ainda restava tempo.Acordou, num susto e sobressalto, do pesadelo que tivera.E passou a viver, como nunca tinha vivido antes.

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